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A violência (nada) discreta nos grupos de Whatsapp dos pais da escola

Quem hoje em dia consegue se manter fora de pelo menos um grupo de Whatsapp? Seja entre familiares, amigos, trabalho ou na escola dos filhos, essa dinâmica dos grupos digitais se estabeleceu como padrão.

Por Carola Videira, publicado no site Just Real Moms

Os grupos de pais, em geral, nascem com o intuito de simplificar e aproximar da vida cotidiana dos filhos na escola. Mas a experiência de muitas pessoas tem ido na direção contrária, sendo bastante problemática.

A primeira constatação é que na verdade não é grupo de “pais”, mas sim de “mães”, dada a pouquíssima presença paterna em discussões sobre o acompanhamento dos filhos na escola.

Ausência masculina evidencia um machismo ainda presente na sociedade

Por maior que sejam as campanhas, as iniciativas de empoderamento feminino, a maioria das mulheres continua carregando o fardo de ser responsável integralmente pela parte “chata” da criação dos filhos, como se somente o homem não tivesse tempo para saber se a refeição na escola não foi dada corretamente, se está na hora de comprar novos uniformes ou se determinada disciplina não está agradando aos alunos.

A relação mulher x homem é tão desigual em grupos de escola que, veja que coisa, a presença de um homem vira motivo de elogios.

O homem que demonstra interesse na rotina do pequeno é visto como “pai moderno”, “pai atencioso”, enquanto as mulheres não ganham esse atraente rótulo mesmo estando ali sistematicamente.

E quando o pai se envolve diretamente nas discussões escolares? Aí os comentários jocosos contra ele muitas vezes têm como alvo a mulher.

Algo como: “Esse cara ‘parece mulher’ de tanto que fala”. Ou seja, múltiplas violências de gênero.

Problemas individuais x gerais

Outra triste constatação: muitos participantes de grupos escolares em aplicativos ignoram totalmente a questão do coletivo, priorizando somente o bem-estar da sua criança.

Muitas vezes as famílias confundem problemas individuais com coletivos, criando movimentos agressivos que expõem professores, alunos, a escola e até outros pais.

São pessoas que entendem que seus filhos merecem tratamento “diferenciado”, sendo que, se todas as crianças tivessem ótimo tratamento, não haveria a necessidade de diferenciação.

Nessa disputa individualizada pelo melhor do próprio filho, as discussões por um bem geral acabam se desvirtuando.

Neste tipo de debates acaba se sobressaindo quem grita mais. Essa piora se acentua quando o assunto dá mais força para “quem pode mais”, seja por status, profissão ou influência na escola.

Nós brasileiros estamos, infelizmente, acostumados a esse tipo de violência perpetrada pelos privilégios de algumas poucas pessoas. Normalmente, esse tipo de conduta tem como consequência o silenciamento da maioria dos participantes do grupo que não querem se envolver em polêmicas.

Os grupos têm como função agilizar processos simples e pontuais, mas acabam sendo fonte de ruído e violência, que muitas vezes atropela o papel da gestão da escola.

São relatados diversos casos de homofobia e racismo por parte de pais que querem inviabilizar a diversidade nas escolas. Esse comportamento reflete uma educação pobre na questão do respeito e valorização de todas as raças, etnias e orientação sexual.

A internet não é “terra sem lei”

Atos cometidos dentro dos grupos digitais também podem ser enquadrados como crime de preconceito, danos morais, ameaças etc., como qualquer tipo de posicionamento na vida real.

Então, precisamos entender de uma vez por todas que racismo e homofobia não são questões de opinião, são crimes.

Violências sutis, porém, não menos importantes, são cometidas quando pais usam o espaço para vangloriar os feitos positivos dos seus filhos, criando um ambiente competitivo e sem respeito.

Por exemplo: pais de crianças com deficiência que não avançam na mesma velocidade das outras se sentem diminuídos. Questões financeiras são abertas no grupo, violando a privacidade e expondo famílias em dificuldade. Assunto que deveria ser tratado apenas pela escola acaba sendo escancarado a todos sem o mínimo respeito.

Professores são muitas vezes pressionados e ameaçados no grupo direto com os pais, onde não têm o apoio da instituição escolar. Muitas escolas tentam confrontar com pais furiosos por medo de perder as mensalidades.

O papel da inclusão na escola e em grupos de pais

A boa notícia é que podemos mudar essa realidade.

A reconstrução comportamental é possível através de uma receita simples: se relacionando com mais empatia, seja no ambiente digital ou nos encontros presenciais.

Antes de nos expressarmos ou pautarmos as nossas queixas, é importante fazer um exercício de se colocar no lugar do outro, para entender como a forma e o conteúdo que estamos levando pode impactar o grupo.

No começo, o processo é mais trabalhoso, mas com o tempo aprendemos a ser naturalmente mais conscientes sobre nosso impacto coletivo.

A inclusão passa por criar ambientes mais seguros, onde todos tenham voz para contribuir para a melhoria geral, evoluindo todo o grupo junto.

Quando acolhemos de forma empática a demanda de todos, podemos resolver os conflitos de forma benéfica para todos e não apenas para alguns.

Neste contexto, a diversidade ajuda a pensar de diferentes formas. Em um mundo complexo como o nosso, ter visões diferentes contribui para ganharmos novos ensinamentos e encontrarmos novas soluções.

A pluralidade de conceitos é fundamental para analisarmos os problemas como um todo.

Menos vaidade e mais respeito

Então, num grupo de pais no Whatsapp, muitas das discussões seriam mais bem resolvidas caso houvesse menos vaidade e mais respeito e estímulo ao pensamento coletivo.

A receita vale para todos os relacionamentos em grupo.

Na comunidade escolar ou nos grupos de família, de amigos, do trabalho. A inclusão da diversidade pode ser aprendida por todos e torna nossas relações muito mais saudáveis e construtivas.

Experimente!