Por Carolina Cozer Bacca
No último mês de agosto, o Ministro da Educação Milton Ribeiro deu uma declaração polêmica, afirmando que crianças com deficiência “atrapalham” os estudantes típicos em sala de aula, tornando a convivência e socialização “impossíveis”.
O Ministro sugeriu, também, que alunos com deficiência devem ser colocados em salas de aula separadas, para, supostamente, receberem atenção exclusiva. “Nós temos, hoje, 1,3 milhão de crianças com deficiência que estudam em escolas públicas. Desse total, 12% têm um grau de deficiência que é impossível a convivência. O que o nosso governo fez: em vez de simplesmente jogá-los dentro de uma sala de aula, pelo inclusivismo (sic), nós estamos criando salas especiais para que essas crianças possam receber o tratamento que merecem e precisam”, disse Ribeiro em entrevista coletiva à imprensa.

Afinal, as escolas especiais, ou as salas de aulas direcionadas exclusivamente a PCDs (pessoas com deficiência), seriam uma opção válida e verdadeiramente inclusiva para a educação destes alunos? De acordo com Carolina Videira, Presidente da ONG Turma do Jiló, esse modelo de escola não é, de jeito nenhum, considerado inclusivo. “Pelo contrário”, diz, “as escolas que seguem esse padrão são excludentes e segregadoras. E hoje, diante de todo o avanço da educação especial, da neurociência e das descobertas acadêmicas e científicas, incentivar esse modelo se torna um retrocesso ainda maior. É negar tudo o que a gente tem, hoje, como sociedade”, pontua.

A Turma do Jiló, fundada por Carolina em 2015, é uma associação social sem fins lucrativos que visa implementar e garantir a Educação Inclusiva dentro das escolas públicas. “Cada criança é única nas suas capacidades e limitações, e já deveríamos ter essa consciência até mesmo para os alunos típicos, pois já se sabe que todos os cérebros são diferentes, e que cada um aprende de uma maneira, no seu tempo e ritmo”, diz.
A educação inclusiva mora na individualidade
Segundo a especialista, é preciso que os órgãos voltados à educação reconheçam a individualidade de todos os alunos, e ofereçam o melhor contexto possível para trocas e interações sociais que os ajudem a se desenvolver.
Ou seja, a inclusão de alunos com deficiência não envolve apenas os alunos PCD. “O primeiro passo para uma educação inclusiva é reconhecer a individualidade de cada um, fazer um planejamento para cada um deles e saber lidar com essas particularidades. O professor precisa saber como cada um processa as informações e usar a tecnologia a favor da educação, a favor dos alunos, reconhecendo a importância de manter todos juntos”, afirma.
Separar é segregar
Há 27 anos, a Conferência Mundial sobre Educação para Necessidades Educativas Especiais deu origem a um dos documentos mais significativos sobre educação inclusiva, a Declaração de Salamanca, que abriu as portas para novos estudos e inovações que promovem a inclusão nas escolas. Segundo Carolina, discutir o decreto 10.502/2020 no Brasil, que defende a segregação entre alunos com deficiência e típicos, é um retrocesso aos valores da educação básica inclusiva. “A educação inclusiva começa a partir da crença de que a educação é um direito humano básico, e o fundamento para uma sociedade mais justa. No entanto, me parece que ainda estamos evitando esse caminho. Por isso damos tanto valor à Lei Brasileira de Inclusão, que busca assegurar para milhares de crianças e adolescentes o seu lugar entre os pares de sua geração. É uma ferramenta essencial no combate à segregação e à violência que os jovens com deficiência são expostos diariamente em nosso país”, reforça.
O caminho para uma cidadania mais consciente
A sugestão de Carolina para uma cidadania mais consciente e inclusiva no Brasil está na educação continuada dos professores, dentro da realidade do ensino no Brasil. “Os docentes precisam estar aptos a lidar com as diferenças, a explicá-las aos alunos e a mostrar que a convivência e as trocas entre eles são o melhor caminho. A diversidade precisa ser pauta em toda e qualquer escola, porque o mundo é diverso e temos o dever de falar de todos os preconceitos e todas as barreiras que existem e que precisarão ser encarados”, complementa a especialista.

Além da formação continuada dos professores, Carolina aponta para a necessidade de as escolas desenvolverem acessibilidade pedagógica e arquitetônica em seus espaços, além do atendimento educacional especializado no contra-turno escolar. “O plano político e pedagógico de toda e qualquer escola precisa ter essa premissa. É muito importante reforçar que todas as escolas devem estar aptas a receber e desenvolver qualquer e toda criança”.
Desta forma, o melhor caminho para uma educação inclusiva verdadeiramente eficaz no Brasil está na valorização do indivíduo como ser único, com seus defeitos, qualidades e habilidades inatas pessoais, sendo valorizadas em sala de aula e também fora dela, na sociedade como um todo. “Essa inclusão só será total quando conseguirmos ter um olhar do indivíduo, realizando as mesmas atividades sem serem diferenciadas e com equidade educacional. É por isso que lutamos na Turma do Jiló”, finaliza Carolina Videira.