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Cresce a obesidade infantil no país

O aumento de peso está intimamente ligado ao empobrecimento e à insegurança alimentar

Da Redação

Em outubro de 2022, entrará em vigor um novo padrão de rotulagem de alimentos e bebidas industrializadas aprovado pela Anvisa em 2020. As embalagens deverão apresentar um selo frontal com símbolo de lupa para informar sobre altos teores de açúcar, gordura e sódio. Essa medida poderá contribuir para a redução de índices alarmantes no Brasil, em relação à saúde das crianças. De acordo com uma grande pesquisa, o Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (Enani-2019), coordenado pelo Instituto de Nutrição Josué de Castro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e divulgada pelo Ministério da Saúde, 6,4 milhões de crianças têm excesso de peso e 3,1 milhões já evoluíram para obesidade.

Sinal de alerta já na primeira infância

A pesquisa aponta que 7% das crianças brasileiras menores de cinco anos estão com excesso de peso e 3% têm obesidade. Números perigosos em se tratando da primeira infância, período vital para que a criança se desenvolva com saúde, com uma alimentação rica em nutrientes e equilibrada.

Outro problema identificado por especialistas é o não cumprimento do aleitamento materno exclusivo até os seis meses de idade, associado à introdução dos industrializados já durante os primeiros meses de vida. Segundo o Enani-2019, menos da metade (45,8%) dos bebês menores de 6 meses mamam exclusivamente no peito da mãe.

Para se ter uma ideia da gravidade da situação, o estudo mostrou que a prevalência do consumo de alimentos ultraprocessados chegou a 93% entre crianças de 24 a 59 meses e 80,5% entre crianças de 6 a 23 meses. Já o consumo de bebidas adoçadas atinge 24,5% dos pequenos entre 6 a 23 meses, 37,7% dos de 18 a 23 meses e 50,3% das crianças de 24 a 59 meses.

Pandemia acelerou o processo

Os ultraprocessados são os maiores vilões desse mal, segundo pediatras, nutricionistas e nutrólogos. Produtos recheados de sal, açúcar, gordura, conservantes e outros aditivos artificiais, que dão a sensação de saciedade, mas não alimentam: salgadinhos, embutidos, sucos de caixinha, refrigerantes, biscoitos e macarrão instantâneo, entre outros produtos muito consumidos por famílias de baixa renda.

Se antes as famílias tinham dificuldade de acesso a alimentos prontos ou industrializados, hoje eles estão cada vez mais baratos. Já os alimentos saudáveis, in natura (verduras, legumes, frutas), além de produtos básicos como arroz, feijão, ovos e carnes, aumentaram vertiginosamente.

Durante a pandemia, o crescimento da pobreza e a falta de comida na mesa impulsionaram o consumo desses produtos de baixa qualidade, uma lógica perversa de um sistema alimentar doente e que pune a infância brasileira, que não encontra um futuro saudável em seu horizonte. De acordo com estudo recém-divulgado pela FGV Social, os ganhos das famílias brasileiras de baixa renda desabaram 21,5% desde o fim de 2019.

Segundo a nutricionista Daniela Neri, do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da USP, o cenário é alarmante, pois a consequência pode ser a mortalidade prematura. Depois de quinze anos em queda, a mortalidade infantil voltou a crescer no Brasil.

Marketing desleal

Além de muitas vezes terem um custo mais baixo do que os alimentos in natura, os industrializados também são vendidos na televisão e na internet com um marketing muito sedutor – e desleal – para os pequenos. Embalagens coloridas, brindes, promoções e uso de personagens ajudam a ludibriar as crianças, que se tornam reféns de um mercado nocivo, uma vez que há várias doenças decorrentes da obesidade em crescimento no Brasil, como a diabetes, o colesterol alto, a hipertensão e outros problemas cardiovasculares, além da desnutrição. As dietas com produtos ultraprocessados são pobres em vitaminas e minerais, nutrientes necessários para o desenvolvimento saudável de uma criança.

Especialistas consideram que o aumento da obesidade infantil é intimamente ligado ao crescente empobrecimento da população e à insegurança alimentar. As famílias não conseguem comprar alimentos saudáveis, encontrando nos mais baratos, que são também mais calóricos e sem nutrientes, suas fontes diárias de sobrevivência.

Para garantir a mudança desse cenário é preciso investir em políticas públicas que garantam não apenas a presença de alimentos saudáveis e em quantidade necessária, como também a condução de programas educativos de longo prazo, a fim de propagar valores de boa nutrição para famílias.

Sedentarismo é agravante

Além disso, é durante a infância que muitos dos hábitos alimentares que levamos para toda a vida são formados. Assim, os caminhos para frear o avanço da obesidade e da consequente desnutrição passam pelo incentivo à alimentação adequada e saudável, à prática de atividade física e para as ações focadas na saúde integral das crianças.

Mas além dos cuidados familiares e das iniciativas públicas, esse é um trabalho que exige o envolvimento de toda a sociedade. Um exemplo disso são as ações de prevenção da obesidade infantil desenvolvidas pela Pastoral da Criança no Brasil.

Segundo Caroline Dalabona, nutricionista da Pastoral da Criança no Brasil, a iniciativa busca fazer, com a ajuda de voluntários, um acompanhamento de crianças e gestantes que vivem em comunidades vulneráveis a fim de orientar as famílias e compartilhar informações sobre alimentação adequada e saudável, inclusive a implantação de hortas nos quintais. O objetivo é garantir todo o potencial de crescimento e desenvolvimento dos pequenos, o futuro do Brasil.

Fontes: Sociedade Brasileira de Pediatria, Coordenação Nacional da Pastoral da Criança, Agência de dados públicos Fiquem Sabendo e revista Piauí.