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Paz é empatia

Pessoas mais empáticas, generosas, íntegras, compreensivas e amigas trazem paz. Que tal cultivar esses valores?

Por Chantal Brissac

“Não existe um caminho para a paz. A paz é o caminho”, disse Mahatma Gandhi, líder indiano que é o símbolo do amor no mundo. “O amor é ajudado pela força. A doçura do perdão traz a esperança e a paz”, lembrou Charles Chaplin, outro gênio da humanidade. “A paz não pode ser mantida à força. Somente pode ser atingida pelo entendimento”, declarou o grande cientista e humanista Albert Einstein. Três sábios que falam sobre a paz, a tão desejada paz. Mas, afinal, o que é a paz que tanto se busca? Ela é possível nesse mundo ainda repleto de sofrimento?

Para a filósofa Lia Diskin, da Associação Palas Athena, ela é possível, sim, e depende basicamente do perdão. “Sem ele, não há paz. O perdão é o único recurso que retira a pessoa do sistema da retaliação e da vingança. Ele é a porta de saída que permite a consciência humana. Se você não cria essa cola, de reconciliação e perdão, não cria uma relação humana. A história tem dívidas impagáveis. O que fazer com os índios, com os negros, com tantas pessoas que sofreram? Perdoar não significa esquecer, mas dar uma chance ao resgate humano”, diz Lia, diretora da Palas Athena, instituição que promove, coordena e incuba programas nas áreas de educação, saúde, meio ambiente e promoção social no Brasil.

É Lia quem também cuida da agenda do Dalai Lama no país, desde a primeira visita dele, em 1992. Seguidora dos ideais do líder indiano Mahatma Gandhi, a argentina Lia Diskin é um dos nomes mais importantes da cultura de paz aqui e lá fora. Palavras como empatia, cooperação, desapego, economia sustentável e mobilização soam com sentido ditas por Lia. Ela não fala da boca para fora: desde 1972, quando ajudou a fundar a Palas Athena, Lia Diskin vive com simplicidade e verdade, valores gandhianos que ajuda a divulgar.

Lia Diskin

“Tudo o que vive é teu próximo”, dizia Gandhi. “Hoje, essa reconexão com o vivo, seja uma árvore, um rio ou uma pessoa, é o mais urgente e importante”, afirma a filósofa e educadora, que vê com bons olhos o momento atual: “Felizmente está aumentando o número de jovens que querem ser voluntários no sertão nordestino, na Bolívia ou em Bangladesh, gente que quer viver essas experiências, querem ser, não ter. Conheço jovens que querem morar em ecovilas ou descartam a ideia de ter um carro, preferem uma bicicleta. Há uma grande mudança em curso, e há uma compreensão mais ampla, de que estamos todos dentro de um macroprojeto chamado vida”.

Ainda assim, Lia considera o consumismo desenfreado um grande mal. “Se Gandhi vivesse hoje, a maior luta dele seria parar a onda tresloucada de consumo. ‘Todo aquele que tem coisas de que não precisa é um ladrão’, ele dizia. Obviamente não porque roubou, mas porque está inviabilizando a utilidade de uma matéria-prima e de algo, não necessitando”, explica.

Para ela, falar em cultura de paz pode parecer algo muito distante. Ela prefere dizer “cultura da convivência”, que é mais factível e concreto. “Quando se fala de paz parece que não depende da gente, e sim das grandes potências, da polícia. Mas está tudo ao nosso alcance: é a capacidade de cultivar a empatia, a convivência amigável, ser gentil com o outro na rua… E tem a ver com valores como generosidade, honestidade, respeito, compreensão, camaradagem. E cultura vem de cultivar, semear”, exemplifica.

Como Lia Diskin, o ator João Signorelli está mergulhado de corpo e alma na missão de divulgar a paz e a boa convivência entre as pessoas. Ator que já foi galã da TV Globo em um número incontável de novelas, Signorelli interpreta Gandhi há mais de vinte anos, em um monólogo que já foi visto por mais de vinte mil pessoas em todo o Brasil. Ele já passou por vinte capitais, cruzou os rincões do Sul e do sertão mineiro, riscou Centro-Oeste, Norte e Nordeste, esquadrinhou o eixo São Paulo-Rio. Com seu traje branco indiano e o olhar doce do líder pacifista, João é o próprio Gandhi, sem tirar nem pôr. Mas mais impressionante do que a semelhança física é a simbiose espiritual dos dois: João Signorelli e Mohandas Karamchand Gandhi, o Mahatma (que, em sânscrito, significa “grande alma”), são um só. “O Gandhi me deu um norte”, confessa o ator nascido em Cambuquira (MG), que vive em São Paulo desde a adolescência.

João Signorelli como Gandhi

O ator recusa personagens que não têm a ver com o que acredita e está feliz em encarnar o Mahatma como voluntário, em palcos diversos, que podem ser de escolas, hospitais, presídios, empresas e também em teatros conhecidos.

Generosidade, tolerância, amor. Para João Signorelli, só a junção desses valores poderá curar a humanidade. “Acredito na união da educação, da espiritualidade e da ciência. Isso levará à conscientização das pessoas e à paz. E a paz sem voz não é paz, é medo”, diz João, citando uma frase de Gandhi.

Paz e amor são palavras irmãs e que andam de mãos dadas, porque se entrelaçam em seus significados mais profundos. A paz não existe sem o amor ao próximo. O verdadeiro amor é feito de doação e de respeito, sinônimos de paz. Procure a paz e você achará o amor. Sinta amor e você terá paz.

Muito já se escreveu e se cantou sobre a paz, simbolizada pela pomba e pela bandeira branca, descrita como um estado de calma e tranquilidade. Ela é sinônimo de equilíbrio, harmonia, tolerância, respeito. Mas a raiz da palavra, derivada do latim, talvez guarde o significado mais importante. Paz vem de Pacem, ou Absentia Belli: ausência de guerra. Não há paz enquanto houver ódio, vingança e egoísmo, sentimentos ligados à violência. E, como lembra Lia Diskin, é o perdão que poderá curar essas chagas e trazer a paz.

Um exemplo prático é o do “Oponopono”, técnica que existe há três mil anos no Havaí e que prega a cura interior antes de trabalhar o que está fora. Segundo essa filosofia, quando compreendemos que tudo o que acontece em nossas vidas é nossa responsabilidade absoluta, nossa história se modifica para melhor. O “Oponopono” é uma forma amorosa de dizer perdão, para nós e para os outros. “E o ato de perdoar libera o peso do passado, abrindo caminhos e trazendo uma deliciosa sensação de paz”, diz o psiquiatra norte-americano Fred Luskin, autor do livro O poder do perdão. “Paz na mente, no corpo e no espírito. Há um grande alívio por não precisar guardar mais ressentimentos, rancores e mágoas, emoções que fazem mal à saúde e trazem doenças. No início da prá¬tica, a paz surge em pequenas on¬das, mas, com o tempo, vai tornando a pessoa mais forte, mais cal¬ma e capaz de enfrentar outras dificuldades”, diz o médico, trazendo um grande estímulo para procurarmos a paz, em todos os sentidos. Namastê!